A Vila Autódromo tem lutado contra a remoção Olímpica por anos. Moradores da comunidade travaram uma forte campanha com muita paixão para fazer valer o direito de permanecer em suas terras, na qual a comunidade tem resistido por mais de 40 anos. Foram utilizadas táticas criativas de resistência, que vão desde um plano de urbanização premiado que mostrou como a prefeitura poderia facilmente integrá-los em seus planos por um custo mais baixo, a uma campanha de vídeo viral baseada na hashtag #UrbanizaJá, até a atualizações diárias de grafite nas paredes, que deixavam os visitantes sem nenhuma dúvida do que os moradores pensavam, constantemente, sobre as ações da prefeitura em seu bairro.
Lentamente e com um aumento constante de tensão, e até mesmo violência, a comunidade de 600 famílias foi reduzida a apenas 20 famílias remanescentes através de uma combinação de intimidação e aumento de ofertas de compensação aos moradores removidos. Em abril, graças à união e determinação da comunidade, o apoio constante de defensores públicos e ativistas de toda a cidade e pelo mundo e a atenção e destaque dado pela mídia internacional, os moradores remanescentes saíram vencedores em um acordo histórico que garante a permanência deles nas terras–o primeiro acordo do tipo, coletivamente assinado, na história do Rio.
Segundo o acordo, as casas deveriam ter sido entregues no dia 22 de julho. Porém, com um pouco de atraso na entrega, na terça-feira 26 de julho, os moradores finalmente foram receber as chaves da prefeitura. No entanto, eles descobriram que as obras ainda não estavam concluídas. A eletricidade não estava ligada as casas, não havia postes de luzes na rua, e a rua da igreja–único edifício que permaneceu da comunidade original–não estava completa. Incapazes de confiar que a prefeitura iria terminar o projeto após receberem as chaves, os moradores se recusaram a concretizar o ato da entrega das “casas semi-construídas”. Os defensores públicos elaboraram um acordo, assinado por autoridades municipais e moradores, afirmando que a Prefeitura iria terminar o projeto e entregar as casas antes dos Jogos Olímpicos, com os moradores esperançosos de receber suas casas até o final da semana.
Na sexta-feira 29 de julho, os moradores se prepararam novamente para receber suas chaves. Junto aos representantes da prefeitura e aos defensores públicos, os moradores inspecionaram as casas uma a uma, garantindo que elas estavam devidamente concluídas. Depois de inspecionar sua casa, Antônia Henriques, a mãe da Maria da Penha, disse adorou a casa, com um sorriso largo no rosto. Mas para muitos, esta alegria foi interrompida por memórias felizes de suas antigas casas. Como disse Luiz Claudio Silva depois de inspecionar sua nova casa, uma fração do tamanho de sua antiga: “Não é o ideal, mas é uma boa casa”.
A inspeção minuciosa das casas revelou alguns pequenos problemas que ainda precisavam ser resolvidos pela prefeitura, como as janelas que não fecham bem. Porém, ficou decidido que estes defeitos não eram grandes o suficiente para que as casas não fossem entregues. Os defensores públicos e os representantes da prefeitura, em seguida, revisaram o acordo legal para a entrega das casas, dando à Prefeitura um prazo de dez dias para corrigir os defeitos. Os defensores públicos também tiveram o cuidado de incluir a obrigação da prefeitura no fornecimento de mais melhorias para a comunidade. Durante uma entrevista com a NBC, a autoridade da Prefeitura responsável pela entrega das casas deu a sua garantia de que a área em torno das novas casas da Vila Autódromo sempre será terra pública, sem fins lucrativos, apaziguando os receios dos moradores de que a terra seria utilizada por empreendedores imobiliários de forma inescrupulosa após os Jogos.
Uma vez que o acordo legal estava escrito, Dona Dalva de 82 anos se tornou a primeira moradora da Vila Autódromo a receber as chaves e o título do seu novo lar. As outras 19 famílias seguiram, assinando o acordo e recebendo suas chaves sob os aplausos de uma pequena multidão. Sandra Regina, ao receber as chaves, levantou os braços para o céu e gritou: “Vitória!”. Os moradores então passaram o final de semana se mudando, e as últimas casas restantes na Vila Autódromo serão derrubadas esta semana.
O casal agora bem conhecido, Luiz Claudio Silva e Maria da Penha Macena, estão ansiosos para escrever “uma nova página da sua história” em sua nova casa. Maria da Penha sente finalmente que “os direitos da comunidade foram respeitados, tendo lutado por tanto tempo para isso acontecer”. Mas ela não parará de lutar. Para ela, “a luta pelo direito à moradia continua, com muitas outras comunidades da cidade ainda sofrendo”.
“Esta vitória”, diz ela, “não é minha, não é do Luiz, ou mesmo da Vila Autódromo. É para toda a cidade do Rio de Janeiro”. Vale a pena lembrar que para cada família que ganhou uma nova casa na Vila Autódromo, mais de 1.000 outras famílias foram removidas de suas casas desde que a cidade ganhou o direito de sediar os Jogos Olímpicos em 2009.
A vitória da Vila Autódromo aconteceu mesmo contra todas as probabilidades. Ela serve como inspiração para outras comunidades que enfrentam remoções, não apenas no Rio de Janeiro, mas em todo o mundo. Esta vitória também serve para fortalecer os protestos contra impactos severos dos Jogos Olímpicos em cidades-sede. Frequentemente, é dito que ativistas não irão parar os Jogos Olímpicos, e que não adianta protestar contra o impacto dos Jogos. Mas esta vitória mostra que quando as pessoas são determinadas e organizadas, mesmo enfrentando os maiores interesses imobiliários da nação e no contexto de um estado de exceção proporcionado pelo mega-evento, tudo é possível.