No Estácio–um bairro próximo ao Centro localizado na Zona Norte do Rio–o Bloco 15 do Conjunto Habitacional Zé Keti, parte do Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV), tem sido o lar de algumas remanescentes famílias indígenas desde junho de 2013. Os moradores descrevem o conjunto, construído sobre o terreno da antiga Prisão Frei Caneca, como sendo muito restritivo e “cheio de regras”.
Após serem removidos à força de sua ocupação no antigo Museu do Índio, ao lado do Maracanã, essas 17 famílias indígenas foram inicialmente reassentadas em contêineres em Curupaiti, Jacarepaguá, há mais de uma hora de distância na Zona Oeste. Elas ficaram lá por aproximadamente um ano antes de serem transferidas novamente para os apartamentos do MCMV. “[O prefeito] prometeu construir uma aldeia típica para nós em 18 meses. Ele não conseguiu… Esse Programa MCMV foi a única alternativa que ele ofereceu”, diz Carlos Doethyró Tukano, presidente da Assembleia Indígena Aldeia Maracanã (AIAM).
Depois de dois anos morando no Estácio, a lista de reclamações sobre o conjunto habitacional ainda está crescendo. Entre elas, vazamentos de água, rachaduras nos pisos, decomposição da infraestrutura das paredes, e acúmulo de contas–os moradores do Bloco 15 têm de pagar aluguel mensalmente, assim como gás e eletricidade, que não estão incluídos no contrato. No entanto, sua maior queixa até o momento é a falta de espaço.
De acordo com a Lei 6.001 do Estatuto do Índio, o governo deveria “assegurar aos índios a possibilidade de livre escolha dos seus meios de vida e subsistência” (Título I, Art. 2º, IV) e “executar, sempre que possível mediante a colaboração dos índios, os programas e projetos tendentes a beneficiar as comunidades indígenas” (Título I, Art. 2º, VII). A comunidade indígena da Aldeia Maracanã tem tentado adquirir um novo espaço em que possa receber pessoas, incluindo outras comunidades que estejam de passagem pelo Rio. Eles lamentam por não terem tido condições de fazê-lo durante os Jogos Olímpicos, quando muitas comunidades indígenas estiveram visitando a cidade. Carlos Tukano reiterou seu desejo de que a prefeitura em breve cumpra sua promessa de restaurar um prédio para permitir que eles pratiquem integralmente sua cultura outra vez.
Além de estarem limitados em termos de espaço e práticas culturais, alguns dos moradores indígenas do Conjunto Zé Keti também restringiram suas próprias atitudes dentro do bairro. “Aqui ninguém sabe quem é quem”, disse Carlos Tukano, que diz a suas filhas para terem cuidado com o que dizem e como agem na vizinhança. Ele continua: “O índio já é mal visto. Juntando com essas coisas vamos ter ainda mais problemas”, referindo-se às milícias e às gangues de droga que tentam controlar a área. Dentro do conjunto, a comunidade indígena não interage de fato com os outros moradores. As várias tribos que vivem em um prédio conhecem umas às outras, mas isso não acontece com todos os prédios do conjunto, diz Carlos Tukano.
A comunidade continuará buscando um novo espaço até que eles possam praticar sua cultura em paz novamente. Algumas famílias vão ficar, mas Carlos Tukano está determinado a se mudar. Ele não irá desistir da sua luta pela cultura indígena que começou há 27 anos, quando deixou sua casa na Amazônia para descobrir a vida urbana no Rio de Janeiro.