No dia 8 de julho, o Instituto de Arte Tear, com representantes do Museu da Maré, Museu do Samba, Instituto dos Pretos Novos (IPN) e Ecomuseu de Sepetiba, organizou um colóquio intitulado Rotas da Memória, que explorou a questão do que se qualifica como patrimônio. O evento, com o objetivo de responder a pergunta: “O que é o patrimônio para nós?”, representou a “culminância de diversos percursos pela memória dos territórios, momento de partilha junto à rede de pontos de cultura, como um convite a lançarmos juntos uma reflexão/ação sobre as memórias da cidade desde os territórios, agora redefinidores de outros patrimônios possíveis”. O evento foi, em última análise, “um convite a escrevermos de forma co-elaborAtiva cartografias poéticas do patrimoniável”.
O colóquio de quatro horas foi aberto com uma visão geral do recente projeto cartográfico de mapeamento do Instituto Tear, de cinquenta pontos culturais no Rio, que foram classificados em rotas, uma ao longo da Avenida Brasil na Zona Norte, por exemplo. As identidades foram mapeadas, mostrando não apenas rotas, mas pontos culturais, estabelecendo uma rede de centros e coletivos que juntos delineavam identidades culturais claras. Ao longo da apresentação, o Instituto Tear enfatizou como o território é algo que praticamos: “nós o afetamos tanto quanto somos afetados por ele”. Em ambos os projetos de cartografia, o Instituto Tear realizou atividades com membros das comunidades, explorando a questão do patrimônio. Os membros discutiram o uso da cidade e organizaram intervenções públicas em diferentes pontos do seu território, tais como estações de transporte público e em carros de metrô. Desta forma, o grupo entendeu como a “qualidade do espaço público é ativada pelas intervenções populares” e, juntos, conseguiram criar uma amabilidade do espaço.
A conferência seguiu com dois palestrantes, começando com Lilian Amaral, artista visual e pesquisadora em arte pública e patrimônio cultural do Media Lab, da Universidade Federal de Goiás. Ela enfatizou a importância da prática artística em espaços públicos, em contraste com a produção artística. A prática artística é uma maneira de criar significado e problematizar o que foi normalizado.
O segundo palestrante, historiador, escritor e pesquisador da memória do Rio como uma cidade da diáspora, Luiz Antonio Simas, se engajou em dinâmicas de contação de estórias, misturando o samba tradicional e enfatizando o poder e a necessidade de criar um “currículo de desgarrados”. Simas, nascido e criado na Zona Norte do Rio, explora a história dos bairros da Zona Norte e dá palestras públicas sobre a história nas ruas e bares do Rio. Ele demonstrou como contar espontaneamente histórias que preservam o patrimônio cultural e “afastam-se da gramática normativa”, desafiando a história formalizada.
Através do projeto de cartografia ao longo de um ano, e com o Instituto Tear como mediador cultural, está sendo formada uma rede entre o Museu da Maré, o Museu do Samba, o Instituto Pretos Novos e o Ecomuseu Sepetiba. A rede reimagina formas de usar o território do Rio de Janeiro ao reclamar o direito à cidade, e ao visitar uns aos outros através da cidade, em uma troca mútua de aprendizado. Cada museu luta para preservar e celebrar a herança cultural que, de outra forma, não seria considerado “patrimônio” em um sentido tradicional.
Juntos, eles criam os “EntrePontos Cariocas”, que trabalham para promover criticamente a importância da cultura popular e periférica brasileira no entendimento mais amplo de patrimônio cultural. O projeto é informado pelo crescente conceito de museologia social, freqüentemente associado a museus comunitários que tratam todo um território como museu, onde a preservação cultural é alcançada através da celebração do que está vivo, em contraste com a natureza estagnada dos museus tradicionais. O território como espaço de encontro cultural permite que as pessoas reivindiquem a significância de seus espaços públicos. Ao fazê-lo, produtores culturais baseados em comunidades estão ganhando agência em sua atuação e definindo o que é patrimônio para eles, em vez de herdar um conceito imposto por outros. Os EntrePontos Cariocas, juntamente com o conceito de museologia social, estão abrindo um caminho crítico para a resistência cultural e empoderamento no Rio de Janeiro.