Na noite de 30 de novembro, líderes de comunidades de todo o Rio reuniram-se na Câmara Municipal para se manifestarem contra as remoções. O painel da noite marcou o lançamento da primeira “Frente Parlamentar Contra Remoções e Despejos“ do Rio, e contou com ativistas representando os bairros do Horto na Zona Sul, Barrinha, Rio das Pedras, Caetés e Araçatiba na Zona Oeste, e Indiana, Rádio Sonda, e Maracajás na Zona Norte.
O evento marcou a primeira de uma série de reuniões e marchas planejadas contra remoções, onde estão incluídas as manifestações, no estilo de ocupação, no condomínio do Prefeito Marcelo Crivella da sexta-feira passada e em locais chaves do governo municipal nas próximas semanas. Os manifestantes estão exigindo um canal de comunicação mais aberto entre o gabinete do prefeito e as comunidades ameaçadas, pois as promessas anteriores da administração de programar reuniões com os líderes das comunidades não foram cumpridas.
Para muitos, o prefeito fracassou na sua promessa de campanha que propagava que iria “cuidar das pessoas”. “Crivella não defende nada além dos interesses dele”, disse Ana Frimerman de Araçatiba. Araçatiba, uma pequena comunidade localizada no bairro de Guaratiba na Zona Oeste, sofreu o seu primeiro episódio de remoção há dois meses. No dia 3 de outubro, Ana explicou, “a prefeitura chegou e derrubou três casas. São três famílias sem casa”. Recentemente, a prefeitura ameaçou de multar a comunidade por causa do lançamento de esgoto nos arredores, exigindo R$15.000. “Se toda Guaratiba não tem esgoto, por que eles chegaram na área mais pobre?” Ana questionou.
Outros moradores da Zona Oeste manifestaram preocupações similares quanto aos interesses e as justificativas da prefeitura para remoções. Jaqueline Andrade da Barrinha explicou que a ameaça de remoções enfrentada por sua comunidade não tem nada a ver com invasão ilegal da terra ou a precariedade dos serviços. “Não estamos dentro de uma reserva. Temos água. Temos luz. O problema é que a gente está na Barra da Tijuca. Muitas construtoras, muitas empresas estão de olho… Somos uma comunidade pobre dentre de um bairro de ricos”.
Para os participantes, ao longo do painel, se fazia notar que a prefeitura está interferindo em bairros até então ignorados.
Outros ecoaram os laços entre o lar e a história. Ines Ferreira contou que se mudou para a comunidade Indiana em 1974. Ela tinha 5 anos de idade quando chegou, mas a favela, localizada ao pé do Morro do Borel na Zona Norte, existia desde 1947. Os seus pais compraram um lote de terra “cheio de aranhas… escorpiões” e lá começaram uma vida nova. Recentemente, no entanto, a prefeitura desenvolveu planos para demolir as casas e reassentar os moradores da Indiana para mais ao norte, no bairro de Triagem. Agora, ela explicou, Indiana recebe um fluxo constante de visitas por parte da prefeitura, lembrando aos moradores que as suas casas poderão ser derrubadas em breve.
A incessante ameaça de remoção não acontece apenas na Indiana. Edivalma “Di” Sousa contou ao público que Rádio Sonda e Maracajás têm recebido notificações de remoção todos os anos desde 1998. As duas comunidades, ambas localizadas à beira de uma base da Aeronáutica perto do Galeão, têm 60 e 100 anos de existência, respectivamente. Apesar da história das comunidades, os militares ordenaram a moradores que saíssem, “destruíssem as próprias casas, sem deixarem entulho, nem uma pedra”.
Este abuso recorrente causa um enorme impacto psicológico sobre moradores de favelas em toda a cidade. Jaqueline falou da depressão que está se espalhando na Barrinha, e Ines revelou uma lista de medicamentos psiquiátricos que os seus vizinhos na Indiana começaram a tomar. Imagine ver, ela explicou, “o seu marido chegar na frente do trator para proteger o trabalho que ele fez” com as próprias mãos. Quando uma remoção acontece, ela explicou, “a gente não dorme, não come… não alimenta as crianças direto”.
Diante das crescentes ameaças, e apesar destes desafios, os participantes do painel estavam determinados a resistir. Muitos louvaram a ajuda que receberam da Defensoria Pública, da Pastoral das Favelas, e de outras comunidades ameaçadas. A Frente Parlamentar deixou claro na quinta-feira à noite que nos preparativos para lançar a série de protestos deste mês, a solidariedade entre as comunidades ameaçadas não seria um problema. “Juntos somos mais fortes”, Jaqueline lembrou ao público.