Em frente ao Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, no coração da Cúpula dos Povos na Rio+20, líderes comunitários se reuniram para criar uma narrativa coletiva sobre as favelas de hoje. Organizada pela ComCat, o evento reuniu os representantes de cinco favelas das três principais zonas da cidade, cidadãos de bairros formais, e representantes de ONGs em uma discussão dinâmica sobre os principais temas que podem ser ditos para definir as favelas do Rio em 2012.
O debate foi aberto com explicações de como as diferentes comunidades foram criadas, em grande parte por trabalhadores nordestinos contratados nas diversas etapas da construção moderna do Rio de Janeiro, seguido de perto por uma exploração de longa data sobre o Rio como uma “Cidade Partida.”
Neuza Nascimento, fundadora do Centro Integrado de Apoio a Crianças e Adolescentes da favela Parque Jardim Beira Mar em Parada de Lucas (Zona Norte) afirma que a separação ainda existe, dizendo: “A favela de hoje é um espaço fechado, pelo menos onde eu moro, porque não há circulação. As pessoas se sentem protegidas na comunidade pois fora há preconceito, o que significa que as pessoas de fora vêem a comunidade como fechada. É um ciclo vicioso.”
Irenaldo Honório da Silva, Presidente da Associação de Moradores da favela Pica-Pau, em Cordovil (Zona Norte), concorda com a idéia de que a favela é separada e reforçada pelos próprios moradores e destacou a necessidade de mudança. Ele disse: “As pessoas não devem ter vergonha do local onde vivem… As pessoas precisam se livrar dessa idéia. Precisamos abrir e mostrar que podemos mudar a sociedade.”
Parada de Lucas e Pica-Pau, duas comunidades distantes do Centro da cidade e da Zona Sul onde o comércio, a construção e o turismo estão concentrados, não foram pacificadas e continuam marcadas pela ausência do governo. Os representantes das favelas pacificadas observaram que houve uma integração aprimorada desde que recebeu UPP (Unidades de Polícia Pacificadora). Flávio Minervino da comunidade Prazeres em Santa Teresa falou sobre a elevada autoestima e o aumento no número de visitantes, enquanto Carlos Dionísio do Pavão-Pavãozinho, em Copacabana, disse, “É um motivo de orgulho convidar amigos para sair na comunidade.”
A discussão sobre o mercado imobiliário na favela revelou que a situação varia muito dependendo da localização, mas que com as tendências gerais dos imóveis no Rio, os preços subiram e continuam a subir. Carlos disse que no Pavão-Pavãozinho, que recebeu a quinta UPP em dezembro de 2009, um imóvel de um quarto pode ser vendido por até R$300.000, observando que um número crescente de estrangeiros e pessoas do “asfalto” estão comprando na comunidade.
Paula Verônica da Associação de Moradores de Muzema, uma comunidade na Barra da Tijuca, Zona Oeste, falou de sua comunidade quando foi ameaçada com remoção no ano passado, e como algumas pessoas olharam para as residências alternativas em outras favelas próximas, mas não conseguiram encontrar nada dentro de sua comunidade. Ela concluiu: “É praticamente impossível deixar a favela, ou comprar um imóvel dentro da comunidade.”
Atitudes em relação aos mega-eventos do Rio de Janeiro são várias. Paula argumentou contra os desenvolvimentos que ameaçam comunidades, dizendo: “Eu quase perdi minha casa por causa dos mega-eventos. As obras são todas em cima de favelas, literalmente em cima das pessoas. “No entanto, Carlos descreveu-os como uma oportunidade. Ele disse: “Para nossa cidade, receber e produzir mega-eventos é uma coisa positiva. O mundo está assistindo, o que é bom.”
Theresa Williamson, Diretora Executiva e fundadora da ComCat discutiu o fenômeno geral em todo o mundo em relação aos Jogos Olímpicos. Ela disse: “Mega-eventos permitem que as pessoas no poder na ocasião executem suas idéias. Se quem está no poder quer fazer mudanças positivas, ótimo, mas normalmente o resultado é um estado de exceção (das leis e da participação) e uma grande luta na parte da população.”
Discutindo a vida econômica da comunidade, Neuza descreveu que a economia de Parada de Lucas é baseada em materiais de construção e trabalho na construção da comunidade, acrescentando que a maioria das pessoas trabalham fora da favela. Flávio falou sobre como as empresas nos Prazeres estão ainda sendo formalizadas, mas que o aumento de turistas após a pacificação levou as empresas a melhorarem. Irenaldo comentou sobre a necessidade de treinamento para que os pequenos empresários possam melhorar as maneiras de como gerenciar as operações.
A discussão concluiu com esperanças para o futuro, colocando a pergunta “Qual é a sua visão ideal para a sua comunidade?” Enquanto todos falaram sobre as necessidades específicas de suas comunidades, emergiram temas comuns. Saneamento básico e coleta de lixo são as prioridades, citados especificamente por Irenaldo, Neuza e Paula. Nos Prazeres, mobilidade ao topo da favela é um sonho da comunidade, disse Flavio. Carlos chamou atenção para títulos de terra registrados dando às pessoas os seus direitos legais. Paula também disse que há uma demanda para a formalização da comunidade, dizendo: “As pessoas querem poder fazer exigências do governo. Como é atualmente, várias pessoas sentem que não tem esse direito.”
Terminando com uma nota de esperança, os participantes reconheceram a importância de reunir pessoas para discutir estes temas. Irenaldo encerrou a discussão com uma chamada para uma interação a mais: “Precisamos de mais do que estamos fazendo aqui hoje: diálogo e participação.”
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