A primeira vez que vi Marielle Franco pelas ruas da Maré foi em 2016. Lembro bem de seu turbante colorido e de estar sentada numa cadeira de bar em pleno sábado, assim como os comunicadores de favelas, ativistas e universitários dali. A roda de conversa foi sobre gênero, raça e juventude, no Morro do Timbau.
Marielle se colocava com uma voz forte, mas também se comunicava apenas com gestos. Estimulava discussões junto ao atual deputado federal Marcelo Freixo e a deputada estadual Renata Souza. Depois desse evento, passei a acompanhar ainda mais sua atuação nas ruas, na política e nas redes sociais.
Escrevo este artigo como uma reflexão sobre sua luta e seu impacto na caminhada de tantas pessoas. Me identifico com ela não só porque fomos nascidas e criadas na mesma favela, tínhamos amigos em comum ou por termos passado na universidade como bolsistas. Foi bem mais que isso, pois nesse pouco tempo, ela me ensinou!
1 – Aprendi Que Representatividade Importa
O pobre conquistou um expressivo espaço de defesa de direitos quando Marielle Franco passou a atuar como vereadora do Rio de Janeiro. Era a primeira vez que estava completamente satisfeita em votar. Mais de 46.000 pessoas pensavam como eu. Marielle passou a ser a voz que pautava os seus: pobres, negros, gays, favelados. Ela representava porque sabia ouvir as pessoas. Essa inclusão não vem de todos. E essa atitude nos mudou, nós que fazemos parte de sua luta.
2 – Aprendi Que Entrar na Política É Um Ato de Coragem
Marielle Franco agiu apesar do medo e das dificuldades e mostrou, na prática, como é possível ser reflexo do que acreditamos. Seja com o corpo na rua, reivindicando um direito, seja ocupando a universidade, até mesmo com pensamentos revolucionários. E principalmente com ações que possam impactar de forma positiva a vida de pessoas que precisam de ajuda e compartilham a mesma dor. Foram menos de dois anos como vereadora e cinco projetos de lei aprovados na Câmara do Rio de Janeiro. Uma vida curta mas que—surpreendentemente—se mostrou para o mundo, mas de uma forma difícil.
3 – Aprendi Que Defender os Direitos Humanos Mobiliza Pessoas
Ela motivou outras pessoas a trabalharem juntas em busca de cada ação fazer valer a pena. Colocou em prática: organizou o 1º Encontro Direito à Favela + Viradão de Comunicação e Cultura no Museu da Maré. Esse foi um evento muito importante para a cidade. Nele, foram realizados debates e formação de políticas públicas com a participação de moradores de favelas em uma madrugada cheia de oficinas. Ali não cabia 46 mil pessoas, mas nas urnas ela já tinha conseguido reuni-las e as transformou em força política através dos votos.
4 – Aprendi Que Receber Apoio Físico e Moral Faz a Diferença
Ela concretizou objetivos porque sabia onde queria chegar. Se fez presente na inauguração do Núcleo PSOL Maré, na realização de debates em espaços de educação, memória e cultura dentro da favela e sua própria candidatura deu uma direção para todos os que queriam chegar em algum lugar. Como grande exemplo temos a Renata Souza, amiga e vizinha da Marielle na Maré, que se candidatou e foi eleita como deputada estadual e presidente da Comissão dos Direitos Humanos da ALERJ. Era preciso dar continuidade a todas as pautas e projetos de lei.
Pra mim, Marielle foi aprendizado. Foi um exemplo para os moradores do Conjunto de Favelas da Maré, periferia carioca onde foi nascida e criada, e também para pessoas de toda a cidade, que se identificavam com as pautas defendidas por ela. Com a repercussão de seu assassinato, que completa um ano neste dia 14 de março de 2019, ela também passou a ensinar para o mundo pelo que vale a pena lutar.
A jornalista comunitária Thaís Cavalcante nasceu e foi criada na Nova Holanda, uma das favelas da Maré. Ao atuar como comunicadora comunitária em sua comunidade, decidiu cursar jornalismo na universidade e acredita no poder da informação para mudar para melhor sua realidade.