365 Dias Sem Ágatha Vitória Félix: Mãe Clama por Justiça em Ato em Memória a Sua Filha [VÍDEO]

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O gesto dos braços em X, junto ao peito, de punhos fechados que correu o mundo, em uma foto de Ágatha Félixuma menina de 8 anos morta ano passado devido ao disparo de um tiro de fuzil de um policial, no Complexo do Alemão, Zona Nortefoi perpetuado por sua mãe Vanessa Francisco no Ato em Memória a Ágatha Vitória Félix, em uma live no Instagram organizada em clamor por justiça para sua filha, no dia 21 de setembro. O ato contou com a presença de Raull Santiago, ativista do Coletivo Papo-Reto; Mônica Cunha, ativista de direitos humanos e fundadora do Movimento Moleque e Rodrigo Mondego, advogado de direitos humanos e responsável pelo caso Ágatha.

“Como mãe, não podia deixar este ato em branco. “Eu grito por justiça!”, afirmou Vanessa, agradecendo a ajuda de toda a rede de apoio que se organizou em volta dela em busca de justiça. Ágatha foi baleada nas costas dentro de uma kombi no Morro da Fazendinha no Complexo do Alemão.

Raull Santiago explicou como foi a rápida mobilização dentro da comunidade: “Nós temos um grupo do WhatsApp, em que monitorizamos a violência no Complexo quando há operações ou tiroteios para haver mais segurança. Nós soubemos da morte da Ágatha assim que aconteceu… Quando acontece algo de mal, a favela se agita. O Voz das Comunidades acionou um monte de pessoas para dar visibilidade ao que estava acontecendo. As pessoas queriam ir para a rua, ficaram na rua, e no dia seguinte houve um ato ainda maior. O mundo inteiro ficou sabendo”.

Mas o ativista ressalta que a agilidade com que a rede se manifestou é sintomática em relação à política de segurança do Estado, que criminaliza as favelas e despreza o direito à vida dos seus moradores, inclusive de crianças. A mobilização da comunidade forçou a Polícia Civil do Rio de Janeiro a fazer a reconstituição da morte de Ágatha Félix. O inquérito policial concluiu que o tiro partiu mesmo da arma de um policial militar.

Segundo a plataforma Fogo Cruzado, um ano após a morte de Ágatha, 28 crianças no Grande Rio foram baleadas pela polícia. Destas, oito não sobreviveram.

“O que a gente fez foi resgatar uma rede que infelizmente nós já sabemos organizar: os contatos que são acionados quando alguém morre. Os de mídia e moradores… Não vamos aceitar o extermínio”, disse Raull.

“Estamos juntos!”, de braços em X, junto ao peito, de punhos fechados, durante a live, anunciou Mônica Cunha, que partilha da mesma dor de Vanessa.

Mônica teve o filho de 20 anos, Rafael da Silva Cunha, assassinado pela polícia em 2006. Ela relembrou o dia da morte dele: “Estava um sol maravilhoso, um daqueles dias que nós cariocas amamos, meu filho estaria fazendo churrasco… Então, eu fiquei com mais raiva ainda, porque o dia ainda estava lindo. Nós somos selecionados para morrer ou sermos encarcerados, mas o que o Estado não contava, é que nós hoje estivéssemos aqui! Olha a porrada que a gente está dando no sistema! Está doendo, mas não adianta, vocês não vão nos silenciar!”, mencionando a campanha da Coalizão Negra por Direitos contra o genocídio da população negra no Brasil. Mônica explicou que os direitos humanos não estão assegurados enquanto houver racismo.

“Genocídio é o extermínio deliberado de pessoas motivado por diferenças étnicas, nacionais, raciais, religiosas e, por vezes, sociopolíticas. No Brasil, ele é resultado do racismo que molda o Estado e a sociedade, que afeta a polícia, as empresas, as instituições políticas e a população como um todo”, menciona o site da Coalizão Negra Por Direitos, que revela que 91% das crianças mortas por “balas perdidas” no Rio de Janeiro são negras, como Ághata Félix.

 

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#justiçaparaágatha#justiçaparaágatha Mix de emoções 😓✊🏾😓✊🏾✊🏾😓✊🏾Porém não vou me calar. Não posso me calar. Já até me perguntaram se tenho medo que façam algo comigo, respondi você acha mesmo que tenho medo? Carreguei minha filha nove meses na barriga, senti dores, trabalhava subindo e descendo escada, chegava em casa cheia de dores nas costas, mas a sensação era trabalhei mais um dia para garanti meu pagamento e comprar coisas para meu bebê que estava por vir, sentia felicidade à cada mês que passava era a sensação que logo logo eu conheceria seu rosto. Eu já sabia que ela viria linda, eu falava está me deixando feia para vir linda🤭. Mix de emoções ✊🏾😔😔✊🏾✊🏾😓😓 Porém não vou me calar. Não posso me calar. A espada está passando, quem me mantém é justo e não dorme. Eu vou ver a justiça acontecer. Por que eu não estou dormindo estou agindo e DEUS providenciando a minha Vitória. Conto com todos para o Ato em memória da minha filha Agatha Vitória, as 19h30 pelo meu Instagram. Mix de emoções ✊🏾😔😔✊🏾✊🏾😓😓 Porém não vou me calar. Não posso me calar. #justiçaparaágatha#justiçaparaágatha

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O ato online em memória a Ágatha Félix foi encerrado com a participação de Rodrigo Mondego. Ele narrou os passos que a Comissão de Direitos Humanos da OAB/RJ deu para avançar com o caso, desde o primeiro momento. Ele recordou as primeiras 24 horas na Delegacia de Homicídio, em que, depois de um tempo de espera prolongado, a médica-legista confessou que não seria possível liberar o corpo da menina até ao dia seguinte, pois ninguém sabia operar o scanner corporalequipamento necessário para realizar a perícia corporal. 

“A médica-legista até se emocionou, era absurdo uma família sofrer tanto por um erro do Estado e ter ainda de sofrer mais por conta de outro erro”, disse Rodrigo Mondego, acrescentando que a Comissão teve de ligar para várias entidades para conseguir alguém apto a fazer o exame para liberação do corpo da criança.

O segundo desafio, de acordo com o advogado, foi reunir testemunhas em um caso no qual tipicamente as pessoas têm medo de falar por ser ameaçadas. Porém, era importante reuni-las para provar que o assassinato de Ágatha não foi causado por um confronto com troca de tiros entre policiais e a facção do tráfico de drogas local, como defendia os agentes da UPP, mas por causa de um erro de um agente de segurança do Estado.

De acordo com Rodrigo Mondego, sete testemunhas aceitaram prestar depoimento no caso para refutar a versão da polícia. Os agentes da UPP alegavam que atiraram contra uma dupla de moto que estaria fugindo de uma blitz, mas o tiro acertou a menina Ágatha Félix dentro de uma kombique é uma alternativa de transporte de moradores de favelas por não existir serviço público de mobilidade dentro das comunidades do Rio. Todas as testemunhas estão mantidas em anonimato. Porém, o motorista da kombi, disponibilizou-se de imediato para “dar a cara”, contou o advogado.

Apesar da denúncia do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) por homicídio doloso e qualificado no ano passado, só agora haverá a primeira audiência com o Ministério Público, marcada para 26 de novembro. Porém, é importante ressaltar que no relatório do delegado foi identificado que um dos policiais foi realmente o responsável pelo disparo. “Isso era o que a gente queria”, explicou Rodrigo Mondego.

De braços em X, junto ao peito, de punhos fechados, Vanessa terminou a homenagem reafirmando: “Estamos juntos!”, enviando um recado para a sua filha, aos participantes da live e a todas as mães e pais vítimas de violência do Estado.

Assista à live aqui:

 

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Agatha Félix

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