Os candidatos à prefeitura do Rio de Janeiro disputam o 2° turno esse domingo, dia 30. Marcelo Freixo e Marcelo Crivella dividem opiniões. Primeiro por sua orientação política: Freixo é do PSOL, um partido de esquerda no espectro político, enquanto Crivella é do PRB, um partido republicano de centro-direita. Para além disso, diferem quanto às suas propostas, uma diferença que é acentuada no que diz respeito às favelas da cidade. Enquanto Freixo menciona 19 vezes a palavra favela no seu programa e traz propostas de governo específicas para elas ou que lá seriam implementadas primeiro, Crivella não menciona nenhuma vez a palavra em seu programa e não traz propostas que pensem as favelas em suas particularidades.
Francielle e Diego, ambos moradores da Muzema, na Zona Oeste carioca, dizem preferir até o momento o candidato do PRB. “Eu não entendo muito, só voto porque sou obrigado”, diz Diego, refletindo um desinteresse sintomático bastante disseminado nessas eleições. Mas para ele, o fato de Crivella ser religioso lhe confere mais chances de fazer “coisas boas” na prefeitura. “Mas na verdade acho que nenhum dos dois está interessado. Prometem, mas sabem que não têm condição de cumprir. Eu sei, porque sou pai. Nem tudo que eu prometo pro meu filho eu consigo cumprir”, conclui ele.
Francielle, por sua vez, teme certos posicionamentos políticos do PSOL, partido de Freixo, como a defesa da descriminalização das drogas, ainda que não seja da competência da prefeitura decidir sobre tais assuntos. Ela vê positivamente, no entanto, que o Freixo tenha propostas específicas para as favelas, pois diz que a situação nelas é bem precária, mas teme, assim como Diego, que seja “só conversa”. Ainda assim, completa: “O Crivella não disse nada sobre favela, mas no decorrer do governo pode vir a fazer, né? Até o Eduardo Paes fez alguma coisa aqui”.
Já Érika, moradora da Mangueira, Zona Norte do Rio, disse que analisou os programas de governo dos dois candidatos e que a característica mais evidente é a superficialidade da proposta do Crivella frente ao aprofundamento do programa de Freixo. “Nesse momento, tenho maior propensão a votar no Freixo, pois suas propostas são mais concretas e objetivas com relação às zonas periféricas”, diz ela. Ela diz que os programas não podem ser a única pauta para eleger um candidato, no entanto: “Se o Freixo for eleito não podemos criar expectativas de viver num paraíso, pois governar uma cidade tão diversa como a nossa está muito além de um planejamento. Nenhum dos dois programas traz uma análise profunda dos riscos que poderiam impedir o seu sucesso”.
Gizele, moradora da Maré, também na Zona Norte, ecoa essas reservas. “Eu, particularmente, acredito que nenhum governo governará para toda a população, ainda mais para a população pobre. Não acredito no estado como garantia de direitos para a maioria pobre”, coloca ela. Gizele acredita, porém, que uma gestão de esquerda tem mais propensão a garantir um mínimo de direitos à população mais pobre do que uma gestão de direita.
Para Érika, de maneira similar, o sistema político é feito pela elite para manter os privilégios da elite. “Crivella quer trazer uma nova velha política. Potencializar o ensino técnico, formar mais cozinheiras, costureiras, pedreiros. Isso já é dito há décadas. Não queremos nos especializar em servir. Queremos opções, oportunidades, explorar nossos muitos potenciais, e queremos que esses potenciais sejam estimulados”. Como ela enxerga, a solução passa pela gestão mais efetiva das estruturas que já existem, e não de novos programas ambiciosos: “Gosto das propostas do Freixo falando em potencializar o que já é feito na favela. A forma coletiva de administrar os territórios da favela, ainda que a sociedade negue, tem dado aula a muitos administradores públicos. Esse reconhecimento de uma produção cultural, social e intelectual dentro da favela já demonstra uma forma diferenciada de olhar pra nós.”
Gizele vê Crivella utilizar a sua igreja como plataforma para obter popularidade, principalmente dentre os mais pobres, e acredita que ele não deveria misturar religião com política. “Vi que durante um ano o candidato à prefeito Marcelo Freixo estudou sobre cidade, fez pesquisas, entrevistou moradores, fez debates públicos, organizou rodas de conversas, ouviu os que mais necessitam de direitos, que somos nós, moradores de favelas, que estamos há 5 anos sofrendo com uma das remoções mais brutais na história desta cidade”, diz ela. Apesar de acreditar na importância dessa estratégia do candidato, Gizele acredita que isso lhe rendeu menos oportunidades de buscar essa popularidade e aproximação com as classes mais baixas, que Crivella buscou por meio da televisão e do trabalho de base de sua igreja nas favelas.
Érika, inclusive, teme a ação dessa igreja se Crivella for eleito: “A Igreja Universal muitas vezes promove a negação de nossa história ancestral como negros e coloca o sujeito no lugar de juiz da escolha particular dos outros indivíduos. Temo que trazer isso para dentro de uma gestão municipal significaria colocar a prefeitura como tutora e cerceadora da nossa vontade como indivíduo”.
Érika espera que o discurso do candidato Marcelo Freixo se traduza em prática, caso ele seja eleito. “Se nós iremos governar junto com ele, nas palavras dele, quem sabe pode estar surgindo de fato a democracia participativa?”